Eupago

ACHA OS LUCROS DA BANCA EXCESSIVOS?

Então peça que lhe aumentem os juros dos seus depósitos
14 Junho 2024

Ao contrário do que uma perceção intuitiva possa sugerir, os lucros dos bancos não cresceram em 2023 porque as taxas de juro cobradas nos empréstimos aumentaram com as subidas acentuadas das taxas euribor.

A explicação mais correta para a subida dos lucros da banca no ano que passou é que as taxas de juro que os bancos pagam pelos depósitos bancários não acompanharam a subida da euribor.

 

Como é que os bancos funcionam?

A principal atividade dos bancos é recolher investimentos financeiros e, com esses recursos, disponibilizar crédito aos agentes económicos que deles necessitam. Dito de outra forma, os bancos concedem empréstimos com os recursos que lhes foram emprestados.

Os bancos não fazem empréstimos com os seus capitais próprios. Os capitais próprios dos bancos destinam-se a garantir a absorção de eventuais “perdas não esperadas” que possam resultar da atividade bancária, de forma a assegurar sempre a devolução dos fundos que foram emprestados ao banco (i.e: os “depósitos bancários”).

Esta constatação é crucial para se perceber a natureza do negócio bancário.

Os bancos têm assim duas grandes áreas internas. Uma área que pede dinheiro emprestado. E outra área que empresta o dinheiro que o banco pediu emprestado (os “depósitos bancários”).

Assim, a margem financeira é a diferença entre o custo total dos depósitos bancários que os bancos captam e o preço a que os bancos emprestam essa liquidez, ou seja, as taxas de juro nos empréstimos que fazem. No agregado dos maiores bancos em Portugal esta margem aumentou para 10,4 mil milhões de euros em 2023, cerca de 70% mais do que no ano anterior.

Coloca-se, então, a questão de dividir a margem financeira gerada pelo banco entre as duas grandes áreas internas dos bancos.

Para tal, é necessário definir um modelo de análise simplificado de um banco típico. Nesse modelo existe uma estrutura central que paga a “euribor” à área que capta os recursos financeiros. E que, por sua vez, empresta (à taxa euribor) esses recursos captados à área do banco que faz crédito aos agentes económicos.

Aa taxas euribor servem, assim, de “preço de transferência” interno entre as duas grandes áreas de negócio que existem em quase todos os bancos comerciais.

 

Como se deve gerir um banco?

No caso de um banco que não tem agências bancárias para fazer a captação de depósitos junto dos particulares e empresas, o que acontece é que esse banco tem que comprar “no mercado” o dinheiro que vai emprestar.

E o preço que tais recursos financeiros de terceiros teriam seria precisamente o valor da euribor. Isto porque é exatamente essa a taxa de juro a que os bancos emprestam dinheiro uns aos outros no mercado interbancário.

Assim, o “mercado” é sempre o lugar onde os recursos financeiros terão de ser comprados pelos bancos que não tenham rede de agências.

Ou seja, a área de captação justifica a sua existência na estrutura do banco porque consegue obter recursos abaixo do preço de mercado. De forma análoga, a área de concessão de crédito faz o mesmo se conseguir rentabilizar esses recursos acima da euribor que era o valor que resultaria da sua aplicação direta à taxa de juro do mercado interbancário.

O “spread” que nos empréstimos é adicionado à euribor é a margem que a área dos bancos que concede crédito aos agentes económicos adiciona aos empréstimos para tentar ter lucro com os mesmos. O “spread” não é o lucro porque tem de cobrir os custos com a concessão do crédito onde se incluem as perdas por incumprimento dos clientes.

Por isto é que o mercado interbancário é sempre a fonte de recursos alternativa que terá de ser utilizada no caso de todas as outras desaparecerem. Daí decorre esta hipotética “transferência” interna de fundos entre as duas áreas dentro de um banco a um preço de transferência interno, que é a taxa euribor, para acautelar precisamente esta eventualidade. E, principalmente, para atribuir, de forma correta, a geração de resultados do banco à área do banco que efetivamente os criou.

 

Afinal, os lucros dos bancos subiram porquê? 

Em 2023, a rápida subida da euribor surpreendeu, não apenas os devedores aos bancos, mas principalmente os seus depositantes que durante os oito anos anteriores se tinham habituado a ter os seus depósitos bancários sem remuneração.

E se ainda tem dúvidas relativamente à afirmação inicial que postula que os lucros subiram porque as taxas dos depósitos não acompanharam as euribor, basta analisar o produto financeiro que nos é mais próximo, o crédito à habitação.

O crédito à habitação tem registado, ao longo dos anos, uma redução prolongada do “spread” que é aplicado em cima da taxa euribor.

Mais recentemente multiplicam-se ofertas de créditos com “spreads” de zero (ou com devolução do “spread” pago que é a mesma coisa), ainda que ocorra apenas por períodos de tempo limitados.

Ora, segundo a metodologia interpretativa que foi explanada, se não existir “spread” num empréstimo, o banco não terá nenhuma margem na concessão desse empréstimo, quanto mais qualquer lucro. Como tal, na concessão desse crédito à habitação, toda a margem financeira que o banco obtém é atribuível à sua capacidade de conseguir depósitos bancários que são remunerados abaixo da taxa euribor.

Por isso, da próxima vez que achar que os bancos têm lucros muito altos preste atenção aos seus depósitos bancários e tente que lhe subam a taxa de juro a que estão a ser remunerados. E, já agora, se puder aproveite também para refinanciar o seu crédito à habitação com um “spread” de zero.


José Carlos Tomás
Diretor de Desenvolvimento de Novos Negócios da Eupago